

Ricardo Darín defende Buenos Aires de um ataque extraterrestre em 'O Eternauta'
Na Argentina, "O Eternauta" é considerada uma história em quadrinhos mítica. No entanto, nunca tinha sido adaptada para as telas. Quando foi oferecido ao astro do cinema Ricardo Darín, sem experiência em ficção científica, o papel principal na série de mesmo nome, ele ficou um pouco assustado.
"Isso aconteceu em um primeiro momento, mas depois fui me acalmando", lembra em uma entrevista à AFP o premiado ator e produtor argentino de 68 anos, ao referir-se às origens do projeto.
Dirigida e roteirizada por Bruno Stagnaro, a superprodução que estreou na Netflix nesta quarta-feira (30) narra a resistência em Buenos Aires a um ataque alienígena a partir da HQ que o roteirista Héctor Oesterheld e o artista Francisco Solano López publicaram entre 1957 e 1959.
Darín, conhecido por filmes como "Nove Rainhas", "Relatos Selvagens" e o vencedor do Oscar "O Segredo dos Seus Olhos", ficou entusiasmado com a ideia de interpretar o líder da resistência Juan Salvo quando notou que os demais envolvidos encaravam o desafio com uma "abordagem muito séria".
A misteriosa nevasca tóxica que mata tudo o que toca, e que é apenas a primeira investida de um exército alienígena, "é algo absolutamente inesperado", conta. "E se você conta isso com respeito, seriedade (...) as pessoas vão abraçar a história."
Para o ator, "O Eternauta" cativou gerações porque é um épico do homem comum sem recursos nem poderes especiais que, unido ao coletivo, enfrenta uma ameaça totalitária.
"Os povos que conseguiram sobreviver são os que se juntaram lado a lado, se defenderam e se interessaram não apenas pelo que lhes acontecia individualmente", apontou.
Assim, a série "interpela" o presente, opinou Darín. A HQ foi uma garrafa lançada por Oesterheld ao mar com uma mensagem "que se transformou há muito tempo nessa espécie de slogan, de leitmotiv, que é: 'Ninguém se salva sozinho'".
Essa dimensão política evoluiu no tempo, com as sucessivas versões que Oesterheld escreveu enquanto aprofundava um compromisso militante pelo qual acabaria desaparecido pela ditadura militar argentina (1976-1983), assim como suas quatro filhas e três genros.
- "Nunca foi feito algo assim" -
A história exigia grandes cenários abertos de aspecto apocalíptico que representavam importantes desafios corporais: "Fisicamente, foi muito, muito trabalhoso", enfatizou Darín, muito mais velho que o Juan Salvo dos quadrinhos, corpulento e de uns 40 anos.
O ator participou de 113 dos 148 dias de gravação, muitos deles com roupas pesadas de inverno e sobre imensos cenários cobertos de toneladas de incômoda neve artificial.
"E sem mencionar as coisas que acontecem em uma filmagem de ação, onde você precisa rolar, pular, cair, colidir, lutar; uma série de coisas que quando você tem 25 ou 30 anos não acontece nada, mas eu que tenho 114", brincou.
A escala da série também implicou grandes desafios técnicos, para os quais foram encontradas soluções no nível de Hollywood. "Nunca foi feito algo assim aqui", destacou Darín, orgulhoso.
- "Um grande paradoxo" -
O astro argentino começará a filmar em alguns dias um longa coproduzido com seu filho, Ricardo 'Chino' Darín, e a partir de setembro estará nos palcos de Madri com "Cenas da Vida Conjugal". Enquanto isso, confia que a repercussão da série será "de alto impacto".
Para ele, "O Eternauta" reafirmará a alta valorização internacional do cinema argentino, o que "constrói um grande paradoxo", em tempos em que o governo do presidente Javier Milei retirou o apoio do Estado à cultura e, especificamente, ao Instituto Nacional de Cinema (INCAA).
"Como se faz para sobreviver a uma valorização tão impactante fora do nosso território e encontrar gente dentro do nosso que coloca em dúvida a importância do estímulo, da defesa da produção audiovisual?", questionou Darín.
B.Koch--BP